quarta-feira, 23 de maio de 2012

Legitimidade Ativa nas Ações de Impugnação de Atos Administrativos (art. 55º/1, a) CTPA)


O art. 55º CPTA possui um alcance claramente objetivista na medida em que confere legitimidade a quem alegue meros interesses de facto, alargando o seu âmbito de aplicação a grupos de “ação popular”.
O art. 55º/1, a) confere legitimidade para impugnar atos administrativos a quem “alegue ser titular de um interesse direto e pessoal, designadamente por ter sido lesado pelo ato nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos”.
De acordo com o critério adotado pelo art. 9º/1º CPTA, enquanto condição necessária para a obtenção de uma pronúncia sobre o mérito da causa, o preenchimento do requisito do art. 55º/1, a) não exige a verificação efetiva de uma situação jurídica invocada pelo autor, bastando-se com a mera alegação dessa titularidade. A legitimidade em questão deve ser aferida em função da verosimilhança pelo autor da situação de legitimidade (1). O Tribunal após verificar que o interessado não é titular da situação jurídica alegada deve considerar improcedente a ação de impugnação intentada pelo autor.
O art. 55º/1, a) exige como condição para a sua aplicação que o requerente tenha um interesse “direto e pessoal”. A concretização do preceito aponta no sentido de que a legitimidade individual para a impugnação dos atos administrativos não tem que se basear na ofensa de um direito ou de um interesse legalmente protegido, bastando que a circunstância de um ato esteja a provocar, no momento em que é impugnado, consequências desfavoráveis na esfera do autor, de modo a que a nulidade ou declaração de nulidade desse ato traga consequências diretas ou imediatas.
A doutrina tem estabelecida uma distinção entre carater pessoal e direto.
Para Aroso de Almeida (2) o carácter pessoal diz respeito ao pressuposto processual da legitimidade, na medida em que se trata de exigir que a utilidade que o interessado pretende obter com a declaração de nulidade do ato impugnado seja uma utilidade pessoal, que o interessado reivindica para si próprio, de modo a poder considerar-se parte legitima, pois alega ser titular do interesse em nome do qual se move o processo. Deste modo, o carácter pessoal prende-se com a possibilidade de o interessado retirar um benefício específico para a sua esfera jurídica.
O carácter direito, ainda no opinião do professor (3), prende-se com a questão de saber se existe ou não um interesse efetivo em pedir a anulação ou declaração de nulidade do ato que é impugnado. Assim sendo, neste ponto é necessário avaliar se o titular do interesse se encontra numa situação efetiva de lesão que justifique o recurso a utilização do meio impugnatório. Neste sentido, o Supremo Tribunal Administrativo tem sufragado o entendimento de que o interesse direto deve ser avaliado tendo por base uma referência ao conteúdo da petição inicial em função das vantagens que o recorrente alega poder retirar da declaração de anulação do ato, sendo que os “efeitos decorrentes de anulação devem repercutir-se, de forma direta e imediata na esfera jurídica do impugnante” (4). Deste modo, possui legitimidade para impugnar quem “esperar obter da anulação do ato impugnante um benefício e se encontrar em condições de o poder receber” sendo o interesse direito desde que “de repercussão imediata na esfera do interessado” (5).  No mesmo sentido: “o interesse será legitimo quando é protegido pelo ordem jurídica, será direito quando tem repercussão imediata no interessado e será pessoal se a repercussão da anulação do ato se projetar na sua própria esfera jurídica” (6).
O interesse direito, exigido noa art. 55º/1, a) CPTA não se confunde com um interesse hipotético ou eventual, uma vez que não se dirige a uma utilidade que possa advir diretamente da anulação do ato impugnado.
Para Aroso de Almeida (7), o carácter direito, do interessado não se prende com questões de legitimidade processual, mas sim com a questão de saber se o titular do interesse, enquanto parte legítima, tem efetiva necessidade de tutela jurisdicional, ou seja, se o interessado tem interesse processual ou interesse em agir.
A título de exemplo: não basta que o impugnante alegue ser proprietário de um prédio em relação ao qual corre um procedimento de declaração de declaração de utilidade pública ou que o funcionário alegue ser arguido num procedimento disciplinar: a admissibilidade da utilização da via impugnatória pressupõe a ocorrência de uma circunstância concreta que determine a necessidade de recorrer aos tribunais (8).
Assim sendo, perante o ato invocado pelo autor é necessário verificar se existe uma efetiva lesão que fundamente uma necessidade de recorrer à tutela jurisdicional através de um meio impugnatório. Pode suceder que numa situação, em concreto, esteja preenchido o interesse pessoal, e por isso, se considere a legitimidade do autor, mas em que não lhe é conferido um interesse direto, ou seja, um interesse processual em agir.
Um exemplo tradicionalmente controverso diz respeito aos pareceres vinculativos. Neste caso, é inquestionável a legitimidade do requerente de um licenciamento para a impugnação de pareceres desfavoráveis que vincule o órgão competente para indeferi o seu requerimento, uma vez que da declaração de anulação ou de nulidade o interessado consegue obter um interesse pessoal. A questão levante, sim, controversa no que diz respeito ao carácter direito. Aroso de Almeida (9) considera que uma vez que os pareceres vinculativos decidem em que sentido devem agir os órgãos que por ele se encontram vinculados, é indiscutível que eles possam ser impugnados pelas entidades a que esses órgãos pertencem - art. 59º/1, c) e d) (10). Neste sentido, o requerente que aguarda a decisão final a proferir no termo do procedimento não tem interesse direito na impugnação. A jurisprudência, contudo, tem orientado a sua posição num sentido mais permissivo, admitindo que o interessado possa recorrer a uma tutela antecipada através da impugnação direta dos pareceres vinculativos desfavoráveis.

(1) Acórdão do STA, 3 de Março de 2004, Processo nº 1240\02
(2) ALMEIDA, Mário Aroso de, “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, 2010, pp.234  - 235
(3)idem pp. 236 - 237
(4) Cfr. Por exemplo, os Acórdãos do Pleno do STA de 27 Fevereiro de 1996; ALMEIDA, Mário Aroso de, “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, 2010,p. 235
(5) idem
(6) Acórdão Tribunal Administrativo do Norte, de 28 de Abril de 2010. Proc. 000122\09.2 BEMDL
(7) ALMEIDA, Mário Aroso de, “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, 2010,p.236
(8) ALMEIDA, Mário Aroso de, “O Novo Regime nos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2003
(9) ALMEIDA , Mário Aroso de, “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, 2010, pp- 237 - 238
(10) Na mesma linha Pedro Gonçalves, “Apontamentos sobre a função e a natureza dos pareceres vinculativos”; Caderno de Justiça Administrativa, nº 9 -12


Bibliografia
ALMEIDA, Mário Aroso de, “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, 2010
ALMEIDA, Mário Aroso de “ O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2003
ANDRADE, José Carlos Vieira, “Justiça Administrativa”, Almedina, 2011

Liliana Colaço, nº 18221


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